Majurugenta
é o primeiro álbum dos Ghorwane, provavelmente a mais influente banda moçambicana
e seguramente a mais importante surgida após a independência do país.
Obra concebida
na viragem de uma era, gravada em 1991, nos estúdios da Real World – antes do
Acordo Geral de Paz rubricado entre as forças beligerantes do partido/governo
da FRELIMO e a guerrilha da RENAMO, em 1992, após uma longa guerra civil que
durou 16 anos –, e lançada em 1993, já em período de paz, é um álbum carregado
de sentimentos e emoções próprias da época. A banda no seu melhor, com alguns
dos melhores executantes que por lá passaram – Zeca Alage, Tchika Fernando,
Carlitos Gove, Riquito Mafambane e Celso Paco –, o álbum soa como se a banda estivesse
dividida entre a alegria de finalmente poder gravar um disco e a frustração de
viver em uma terra em guerra.
Os compositores,
principalmente Zeca Alage, soam desesperados e desconsolados. O álbum começa
intensamente com a força e ritmo de “Muthimba”, uma das melhores músicas do disco
e do grupo, e, logo no primeiro verso, Zeca Alage anuncia apocalipticamente que
“Kuyo sala ku xaniseca” (“Só restou sofrimento!”). Daí em diante
o desespero toma conta do álbum.
Em seguida,
entra a música que dá título ao álbum, “Majurugenta”. Outra música de Zeca
Alage. Uma obra-prima absoluta. 07 minutos e 44 segundos – na capa do disco a
música foi creditada como tendo 07:42min – que passam sem que o ouvinte dê por
eles. Da magnífica abertura da guitarra, passando por todo acompanhamento instrumental,
com as geniais variações do baixo, a música segue tensa, lenta, levada pelo
canto petrificante até a torrente final de sopros e percussões. Alexandre
Chaúque, na edição online do jornal Notícias, escreveu que “foi com “Majurugenta” que Zeca Alage
nos avisou quem era ele, de facto. Com aquele trabalho atirou-nos em definitivo
para a esteira onde nos devíamos ajoelhar para ele passar” (http://noticias.sinfic.pt/pls/notimz2/getxml/pt/contentx/22216).
E não mentiu.
Após
“Matarlatanta” de Roberto Chitsondzo, Zeca Alage volta com mais duas grandes
composições, “Xai-Xai” e “Mavabwyi”. A primeira, uma “sad and powerful song”,
como a descreveu Gerry Leisight no encarte do disco e, a segunda, a mais mexida
música do álbum, sem que, contudo, deixe de ser triste e desesperada.
Estranhamente, “Mavabwyi”, que nas notas do disco é descrito como retratando o
período logo após a independência do país, ocorrida em 1975, fazia muito mais sentido
em 1993, com o dilema do SIDA, que já se tornava mundialmente famoso, e faz
muito mais hoje, onde se vai morrendo cada vez mais e repentinamente nos
hospitais (Amosse Macamo, do blog Modaskavalu, também diz algo parecido sobre
“Mavabwyi”, contudo escrevi sobre a música antes que tivesse lido a sua
postagem naquele blog).
Efectivamente,
Zeca Alage acaba contribuindo com apenas 4 músicas para o álbum. No entanto,
ele domina o álbum. As suas músicas é que dão direcção e foco ao álbum, e, por
todo álbum, podem-se ouvir os seus sopros e a sua marca.
O resto do álbum
é composto de músicas de Roberto Chitsondzo, dentre as quais se destaca
“Sathuma”. Uma música calma e repetitiva, que embala o álbum e o ouvinte para o
estranho e dramático mundo de Chitsondzo.
Para quem vem
aquecido pelas muthimbas de Zeca Alage, a segunda metade do álbum soa à uma
chatice sem fim nas primeiras audições. As músicas de Chitsondzo parecem estar
no lugar errado e o álbum sabe à falta de coesão. No entanto, à cada nova
audição, as composições de Chitsondzo, vão se revelando e impressionando.
As músicas de
Chitsondzo são muito mais leves e simples do que as de Alage, mas como o canto
de Chitsondzo é dramático e suas composições lentas, praticamente sem vida,
acabam sendo tão sombrias quanto as de Zeca Alage.
A música de
encerramento espelha melhor o humor do álbum e das composições de Roberto
Chitsondzo. Com “Akuhanha”, não se entende se a banda está a celebrar ou a
chorar. A única coisa que se discerne é desespero.
por Niosta
Cossa
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