quinta-feira, 10 de maio de 2012

Jimmy Dludlu – Essence of Rhythm


Essence of Rhythm soa como um album de um artista que não tem certeza sobre que rumo seguir. Só as primeiras quatro músicas são tão distintas umas das outras que não se descortina nem o tom nem o ritmo do álbum – o prelúdio é verdadeiro Soukous; “So Close Yet So Far Away” é puro Jazz; “Point of View” é Jimmy Dludlu no seu melhor, agarrado às suas raízes afro; “Wish You Were Here” é neo-psicadélica.

Entende-se. Depois de Echoes from the Past, que foi o seu primeiro álbum (à solo) e um sucesso, Mr. Dludlu tenta seguir sua própria voz, seu próprio estilo, procurando evitar, no máximo possível, similaridades e comparações com o álbum anterior. Por isso faz várias experimentações, algumas bem estranhas, como “Makonde” e “Freedom Song”.

Este é um álbum incaracterístico e menos conseguido do que o anterior. Mas tem grandes momentos – “Point of View” e “Mr. Mokoena” são obras-primas.

De qualquer das maneiras, um álbum de Jimmy Dludlu sempre vale uma audição, se não pelas músicas, pela competência e graça dos instrumentistas. Fora isso, Essence of Rhythm, de 1999, vale ainda como o anúncio do que viria a seguir em Afrocentric.


por Niosta Cossa





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Alfredo Mulhui – Se U Khohlwile


Definitivamente, os álbuns da Música Ligeira Moçambicana, com excepção de pouquíssimos, não são de fácil travessia. Se U khhlwile, de Alfredo Muhlui é mais uma prova disso. Não é fácil.

Ainda que Alfredo Mulhui fosse assumidamente um artista de Reggae, Se U Khohlwile tem pouco de Reggae. É mesmo um álbum da Música Ligeira Moçambicana.

E, no álbum, o Gigante de Manjacaze – como uma vez o apelidou o extinto jornal O Campeão – incluiu aquela que talvez seja a sua melhor música, a que dá título ao álbum. De seguida, por via do alinhamento desastroso que se deu ao álbum, aparecem duas músicas lentas e mortas – a balada “Paulina” e a reggae “Quero Você” –, que realmente não colaboram para a compreensão do álbum. Não que as músicas sejam más – a primeira, aprticularmente, é boa –, é que estão na posição errada e dificultam a audição deste Se U Khohlwile – uma das características dos álbuns da Música Ligeira Moçambicana, infelizmente, é a desorganização e o desastre que são o alinhamento (e o trabalho gráfico e a maneira, pouco séria, com que se aborda a ficha técnica) dos álbuns.

Apesar das falhas e da desorganização, sem esquecer o facto de este não é o melhor Alfredo Mulhui, Se U Khohlwile consegue ser um bom álbum.

Vale por momentos como “Se U Khohlwile”, “Mundhavazane”, “Ungahembi” e “Leonor”. E vale também pelos ataques de Alfredo Mulhui  ao pai (em defesa da mãe) – numa altura em que, em Moçambique, ainda não se falava (com tanto ruído e alarme) sobre a Lei da Família nem sobre a violência doméstica.


por Niosta Cossa

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Fernando Chivure – Fofoqueira


Fofoqueira é um álbum da Música Ligeira Moçambicana. É um álbum de Fernando Chivure e carrega os temas que foram recorrentes na carreira do autor: as relações familiares e as intrigas entre vizinhos.

Dos cantores moçambicanos, existem três que têm vozes tristes e cantos dramáticos que, praticamente, tornam obscuras e tristes todas as músicas que interpretam: Roberto Chitsondzo, Elsa Mangue e Fernando Chivure. Por isso Fofoqueira é um álbum triste, o que é agravado pela falta de ritmo das músicas e pela lúgubre produção de Humbe Benedito – que também toca todos os instrumentos usados para registar o álbum.

Não é um álbum fácil de se atravessar este, e precisa de muitas audições para se perceber sua essência. Mesmo assim, tem momentos que justificam (ou compensam) a travessia pelo álbum, como a música que dá título ao álbum, “Mukonwana”, ”Waxeni Xaweni”  e “Munti wa Wussiwana”. Esta última, aliás, é uma grande música, a melhor do álbum, só que peca por ser desnecessariamente repetitiva, o que a torna longa mais do que o necessário.

A Música Ligeira Moçambicana tem a particularidade de ter como forte, ou como mais importante, a letra, em detrimento do ritmo, ou da instrumentalização – o que prejudica a(s) própria(s) música(s) – então, quem desconhece a língua em que se canta, “arrisca-se” a desvaloriza-la. Fofoqueira, tal como toda a Música Ligeira Moçambicana, está sob esta condição, daí que não seja uma audição fácil.

Entretanto, recomenda-se.


por Niosta Cossa


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Baden Powell & Vinícius de Moraes – Os Afro-Sambas de Baden e Vinícius


O extravagante poeta Vinícius de Moeta com o quieto guitarrista Baden Powell mais o Quarteto em Cy, numa das maiores, mais duradoiras e ímpares obras-primas da Música Brasileira: Os Fro-Sambas de Baden e Vinícius.

Um álbum belo, espontâneo e infinitamente criativo, mescla inacreditável de alegria (derivada da efervescência do Samba) e tristeza (advinda dos cantos afro-brasileiros da Bahia). A sonoridade é mágica: capoeira, candomblé, samba misturados num som distinto, melodioso e melancólico, criado por Baden Powell. E, liricamente, é Vinícius de Moraes com referências recorrentes à divindades negras-africanas (os Orixás, no geral, e Xangô, Iemanjá e Exu, em particular), belos poemas e aforismos sobre a natureza do amor. O canto, esse, é descontraído e harmonioso, à cargo de Vinícius e do deslumbrante Quarteto em Cy, mais o “coro da amizade” – “nesse coro estão presentes Eliana Sabino, filha do escritor Fernando Sabino, Betty Faria, iniciando sua carreira artística no teatro e na dança, Tereza Drumond, namorada de Baden, Nelita, então esposa de Vinicius, Dr. César Augusto Parga Proença, psiquiatra e o médico Otto Gonçalves Filho” (http://www.luizamerico.com.br/fundamentais-baden-vinicius.php), pois, “a intenção apesar dos arranjos elaborados, era dar um tratamento simples, despojado e espontâneo a gravação” (idem).

É um estranho e petrificante e, no fim da audição, gratificante, este Os Afro-Sambas de Baden e Vinícius, álbum de 1966.

A concepção do álbum, criado para ser profundo enquanto soa à lúdico e ao mesmo tempo acessível, fundindo afro-ritmos com o samba acusticamente é ousada o quanto baste, mas funciona – quase 10 anos depois, Gilberto e Jorge Bem tentaram a mesma fórmula com músicas mais longas, mais loucas, mais secas e sem coristas, mas igualmente profundas e grandiosas.

Os Afro-Sambas de Baden e Vinícius vale tanto pela fórmula bem como pelas músicas. Individualmente cada música é única e uma preciosidade. “Tempo de Amor” é tão bonita, tão triste, tão desesperada e redentora quanto “Canto de Xangô” é inspiradora e reafirmadora da vida. “Canto de Iemanjá” e “Bocoché” são calmos e imponentes odes à Iemanjá, seguidos, um após o outro. “Canto de Ossanha”, para além de ser uma obra-prima, abre o álbum e o resume em si: tudo que vem a seguir, ainda que carregando identidade própria, é um pouco desta música.

Simples, inovador, continuamente surpreendente, Os Afro-Sambas de Baden e Vinícius mantém-se actual. O que não espanta: é uma obra-prima genuína.


por Niosta Cossa



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Carlos e Zaida Chongo – Sibo


O que Neil Young escreveu sobre Johnny Rotten, “The king is gone but he’s not forgotten/ This is the story of a Johnny Rotten” [“My My, Hey Hey (Out of the Blue)”], adapta-se muito bem para a história de Zaida Chongo: a rainha se foi mas jamais será esquecida, a grande e única Zaida Chongo!

É 1997, é o primeiro álbum do casal Chongo, o início de um ciclo de álbuns que mudaram e animaram a Música Ligeira Moçambicana.

A Música Moçambicana – falo aqui da música executada com instrumentos ao vivo (excluindo o Pandza e o Hip-Hop e outros géneros e subgéneros juvenis aparecidos na segunda metade da década de 1990 e inícios da década de 2000) tem uma subtil particularidade: ela está dividida. Usando expressões grosseiras, por um lado, tem a música para exportação – de artistas “virados” para o estrangeiro (nos três sentidos, o primeiro, de estarem influenciados por estéticas da música ocidental e africana mundialmente famosa, por exemplo, nos detalhes; nas variações; por vezes, na composição sucinta pop do verso-coro-verso, noutras vezes, na fórmula fela-kutiana longa e descomprometida; e na maneira com fazem as improvisações dos solos; o segundo, de a sua música ter, como alvo preferencial os mercados estrangeiros; e o terceiro, de gravarem nos estúdios estrangeiros, e até lançarem por editoras estrangeiras) cuja música é mais artística, mais complexa, mais detalhada, mais intelectual, mais polida, como os Ghorwane, Kapa Dêch, Eyuphuro, Jimmy Dludlu, as duas versões do Grupo RM (Orquestra Marrabenta Star de Moçambique e Amoya) – e tem a música interna – “música feita para consumo doméstico” de artistas cuja música, ainda que influenciada pela música ocidental, é basicamente tradicional, e é mais directa, linear, simples, bruta, crua, popular, (usualmente gravada em estúdios nacionais, e lançada por editoras nacionais) como Pfani Mpfumo, Eusébio “Zeburane” Tamele, Alberto Mutcheca, Francisco Mahecuane, Alexandre Langa. À esta música interna, vulgarmente, chamam Música Ligeira Moçambicana – com o tempo darei mais detalhes e características da Música Moçambicana.

Carlos Chongo, a força criativa por detrás do duo, éra um herdeiro dos últimos. As suas músicas eram directas, simples, brutas, cruas. Entretanto, tinham uma vibração e um apelo, que não se encontram em nenhum artista antes dele (e ainda não se encontraram em nenhum depois dele). Ou melhor, seu estilo é melhor definido no www.macua.org: “Carlos Chongo é produto da fusão entre a música tradicional "shangana" e a Marrabenta” (http://www.macua.org/mp3/sibo.html).

Aquelas características, que já eram únicas, tornaram-se ainda mais distintas e superiores com a presença e atitude de Zaida Chongo, a mais extravagante, mais provocadora, mais polémica, mais contestada e mais aplaudida dos artistas moçambicanos.

Zaida, entanto que vocalista, éra como a música de Carlos: simples, directa, crua; não tinha grande técnica e sua voz não éra bonita. Mas a sua entrega e o seu canto são dos mais excitantes que se encontram em toda a Música Moçambicana. E quando combinavam as vozes, ela e Carlos, criavam algo que de belo não tinha muito, mas que excedia em poder e sedução. Por outro lado, em cima do palco, Zaida Chongo éra imbatível. Aliás, de lá veio boa parte da sua notoriedade. Éra uma grande dançarina. E muito escandalosa.

A banda que os acompanhava éra muito forte. Como guitarrista, Carlos Chongo tinha um técnica e som únicos, e a secção rítmica, composta de Fernando Mavume e Xavier Nhantumbo, éra poderosa; eles é que mantinham a música vibrante e em grande nível.

Particularmente, este álbum tem um grande início. A primeira metade do álbum é formidável. “Hahela”, “Sibo”, “Psikoxana Psa Xaniseka”, “A Wansati” e “Ningue Psikhopsi” são grandes músicas. A segunda metade não é tão impressionante quanto a primeira mas também é forte – onde sobressaem “Ku Tsemba Munu”, “Machele” e “Ungani Tequeli Nuna”.

Sibo, a obra inicial de uma grande banda, é um grande álbum. Outro produto de qualidade de uma grande década para a Música Moçambicana. E este álbum convence logo na quarta música, onde, quando Carlos canta “a wansati” (“a mulher”), Zaida junta-se à ele e afirma “juro, angana tsembo” (“juro, não merece confiança” – em casos de amor, namoros, casamentos); e mais adiante vai ainda mais longe quando Carlos afirma “ku tsemba wansati” (“confiar numa mulher” e ela responde “hoti boha goda hi weshi” (“é suicidar-se”). É Zaida, sim, uma mulher, quem canta estes versos!

Realmente, Zaida Chongo, artisticamente, éra profissional e descomprometida (para além de talentosa). Qualidades que, actualmente, muito raramente se encontram no campo feminino da Música Moçambicana.


por Niosta Cossa



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quinta-feira, 3 de maio de 2012

Wazimbo – Makwêru



Makwêru, sonoramente, é diferente e distante de tudo o que Wazimbo fizera com a Orquestra Marrabenta Star. É mais lento e mais introspectivo do que Independance e Marrabenta Piquenique. E as letras são menos espontâneas, menos lúdicas, e mais elaboradas do que antes na carreira de Wazimbo pós-independência.

Este álbum já não é Marrabenta apenas. É um cruzamento entre Djuma Mukatsika, o Afro-Jazz, a Música Pop e a Marrabenta.

Aqui fica mais claro que Wazimbo é mesmo o maior vocalista moçambicano do nosso tempo – com o devido respeito e vénia por Tony Django. Não tem que ver apenas com cantar bonito, coisa que ele fazia acima de (quase) todos os moçambicanos. A maneira como canta as palavras, o jeito com que as insufla de vida, o jogo que faz entre elas e a melodia que cria, não têm par em Moçambique. Vai e volta dos suspiros e gritos, e passa tanto pelos tons graves como pelos agudos, com a mesma qualidade e maravilhosamente.

Portanto, só a qualidade de Wazimbo garante metade da boa ventura deste Makwêru. Mas o álbum não acaba aí. É uma obra-prima. Álbum de 1998, é mais um grande produto da gloriosa década de 1990.

Começa brilhantemente, com o chamado para a preservação do meio ambiente e para práticas urbanas (mais) saudáveis (“Mambatxi”), continua com categoria, sem uma música má pelo meio, até a última música, que dá título ao álbum, uma balada criada por Sox e interpretada superiormente por Wazimbo. “Makwêru” resume todo álbum em si e, ao mesmo tempo, o eclipsa com sua beleza e grandeza. Uma obra-prima genuína, das melhores músicas moçambicanas.

Grande Humberto Benfica!


por Niosta Cossa


Tito Paris – Live in Lisbon


Tito Paris, ao vivo, em Lisboa, cantando algumas das músicas cabo-verdianas que marcaram gerações e momentos.

De resto, Tito Paris e sua voz (e seus suspensórios) são sempre um grande acontecimento, e, no Club B. Leza, se apresentam em boa forma.

É um excelente espectáculo de música cabo-verdiana este, de 1998, aliás, um excelente espectáculo de Música Africana, onde ao clássico “Sodade” é dada roupagem latina, e pontificam a funaná “Nhor Deus”, a influenciada-por-Reggae “O Pretinha”, a bela “Marina” e as obras-primas “Curti Bo Life” e “Dança Ma Mi Criola”.

Escutar Tito Paris sempre vale a pena, e, aqui, neste Live in Lisbon, acompanhado com graça e excelência, produz dos melhores concertos de artistas lusófonos africanos.


por Niosta Cossa